Acordamos no Horombo (3.720 metros) já com os primeiros raios de sol. Chegamos debaixo de uma nebulosidade muito grande e praticamente era impossível ver os abrigos, mas pela manhã seguinte o tempo estava espetacular! Solzão, céu azulíssimo e o cume do Kilimanjaro coberto por neve branca se revelando como o nosso imponente desafio para os próximas horas desta jornada.
O objetivo deste terceiro dia era chegar ao Kibo Huts (4.703 metros), uma caminhada que duraria entre 5 e 7 horas cortando o deserto alpino até este que é o último abrigo antes do ataque ao cume da Montanha da Lua. Você vai entender bem o motivo do Kilimanjaro ter essa denominação antiga no próximo post dessa série 😉
Este é o ponto exato em que a “Rota Coca-Cola” (Marangu Route) começava a mostrar sua face alpina. Até então passamos por florestas tropicais, cruzamos vegetação varzeana sempre ganhando em média mil metros de altitude diários e a partir de então parecia que as coisas seriam realmente um pouco mais complicadas, não somente pelo esforço de concentração mental exigido, mas principalmente pelo nível de força física que iríamos investir para lutar contra as ameaças das grandes altitudes.
Abrigos Horombo – 3.720 metros – rumo ao topo da África
Viu aí que fiz questão de deixar a minha assinatura registrada no abrigo? Se você um dia passar por lá mande um alô, ok?! Foram várias horas descansando, aclimatando, repousando os músculos dentro desses abrigos; com esse tanto de tempo as pessoas ficam entediadas dentro e começam a deixar marcas por todos os lados, assinaturas internacionais a propósito! Quando já era pouco mais de 6 da manhã, chegou a nossa água quente para a higienização básica e o convite para tomar café veio logo em seguida. Teríamos que sair o mais cedo possível pois era importantíssimo chegar o quanto antes no Kibo para maximizar nosso tempo de descanso e aclimatação. Mas fala a verdade…, com um visual como o da foto a seguir, dá vontade de ficar nesses abrigos por uns bons dias não é mesmo!?
Abrigos na altura das nuvens no topo da África
Pois tem gente que acabava optando por ficar. Na realidade quem escolhe por fazer o trekking durante 5 dias acaba ficando um dia completo no Horobo para aclimatação, inclusive algumas caminhadas são realizadas durante o dia, porém nós optamos pelo tempo mínimo e fizemos com 4 dias. Quem não se sentia preparado para a subida até o Kibo acabava ficando em Horombo sempre por mais um dia. Isso pois se aqui a meros 3.720 metros de altura a pessoa já sentia os efeitos do soroche (mal da altitude), então imagine o que poderia acontecer ao atacar os 4.703 do último abrigo antes do cume…
A preocupação da equipe era sempre constante, a todo momento eramos questionados sobre nosso bem estar, se estávamos nos sentindo bem, sem dores de cabeça, sem mal estar estomacal ou qualquer outro tipo de dor ou tensão muscular – era preciso estar inteiríssimo daqui pra frente desde que pelas próximas horas nesta aventura teríamos nossos organismos postos a prova por uma das atividades físicas mais intensas à qual já fomos expostos até então em toda vida.
Terceiro dia de caminhadas até o Uhuru Peak
Esse é o principal motivo de estar leve – é fundamental ter apenas o básico, carregar só o necessário, apenas alguns quilos a mais na bagagem poderiam ser os responsáveis por uma torção no tornozelo, ou qualquer tipo de lesão durante a caminhada. Para se ter uma ideia das distâncias percorridas, de Mandara a Horombo são 6 horas de caminhada por aproximadamente 11,6 quilômetros. De Horombo ao Kibo são de 6 a 8 horas para vencer 9,6 quilômetros mas a exigência física é muito maior desde que partimos dos 3.705 e fomos a 4.730 metros de altura!
Frio intenso, altitude, peso nas pernas são apenas alguns dos obstáculos
Essa é uma das fases espetaculares do nosso trekking ao cume do Monte Kilimanjaro – Todos conferem os equipamentos antes mesmo de deixar Horombo e o que não é necessário para a caminhada deve ser despachado em um grande saco-seco que é levado pelos carregadores da nossa equipe. Qualquer quilo adicional vai ser sentido nas panturrilhas com toda certeza. Nesta fase é importantíssimo cada vez mais caminhar vagarosamente e beber o máximo de água possível para evitar a desidratação.
Um lanche nas nuvens – primeira parada do dia depois de 3 horas de caminhada
O frio ainda não é um dos principais empecilhos, desde que usando corretamente as camadas de roupas recomendadas pelos guias, é possível “refrigerar-se” da maneira correta enquanto o organismo vai compensando o calor proporcionado pela caminhada. Nós fizemos duas paradas para lanches e reidratação, a primeira foi mais ou menos a 4 quilômetros de Horombo e a segunda a dois quilômetros da chegada ao Kibo. Entre uma parada e outra as caminhadas eram pesadas, desgastantes, mal conseguia carregar meu próprio corpo enquanto os carregadores passavam com bolsas gigantes do meu lado, rindo, pulando, serelepes, como se estivessem caminhando na beira do mar 😀
Típico carregador africano rumo ao topo do Kilimanjaro
Nós chegamos no Kibo com o tempo mais uma vez completamente encoberto. Durante o decorrer da nossa caminhada o céu permaneceu azul até os últimos 30 minutos. Foi espetacular a forma na qual o clima mudou tão rapidamente! Eu sequer tive condições de tirar uma foto do Kibo justamente pois só era possível ver a neblina…
O abrigo Kibo é na realidade uma gigantesca casa construída em um bloco de pedra que possui camas beliche para 60 alpinistas, mas que não possui absolutamente nenhum fio de água ao seu redor. Quando você está fazendo o trekking com uma equipe séria, sequer tem que se preocupar com comida ou água, eles fazem questão de recarregar as garrafas frequentemente com água fervida. Ficamos nesse abrigo apenas o tempo necessário para a aclimatação final antes de subir os últimos 1195 metros que nos separavam de Uhuru Peak, o ponto mais alto de todo continente africano.
Lutando contras os efeitos da altitude no caminho até os abrigos Kibo
Quando alcançamos o segundo ponto de hidratação as minhas pernas já estavam bem comprometidas, o peso era gigantesco nos meus joelhos e articulações. Esta é literalmente o tipo de caminhada que deve ser realizada o mais vagarosamente possível (pole-pole sempre), entretanto os maiores desafios ainda estavam por vir desde que chegaríamos no Kibo às 2 da tarde e à meia noite acordaríamos para começar a caminhada final de ataque ao cume. O mais incrível era ver aquela neve branca nos motivando a persistir sem cessar um instante, porém quando avistávamos a longa trilha que ainda precisaríamos vencer até conseguir chegar naquele topo nevado, por instantes a vontade de desistir era generalizada em nosso grupo.
Já próximo do Kibo antes de finalizar nossa caminhada
Mas nós não desistimos, lutamos até o final e a história do nosso ataque ao topo do Monte Kilimanjaro você confere na próxima matéria desta série, não vá perder hein! Assante sana 🙂
http://www.youtube.com/v/CAslPji8I78
Trekking ao Topo do Monte Kilimanjaro – Tanzânia
Que viagem incrível! Adorei os detalhes e já estou esperando o próximo post!
Agradeço muito por sua visita e comentário 🙂 Se tudo der certo até amanhã o novo post com o último capítulo estará no ar!
Que beleza! linda paisagem, clima. Ainda mais como você descreve com detalhes a sua viagem tudo fica mais bonito ainda.